“Atrás da Campina” II


Foi apresentado no passado dia 4 de Fevereiro, véspera de Carnaval, na casa do Povo de Mira, a Ante estreia do documentário sobre os “Caretos da Lagoa”, sob o titulo de “Atrás da Campina(1)”, documentário este levado a cabo nos últimos dois anos e que foi realizado e produzido entre outros por Alexandre Mestre, um mirense ligado as artes plásticas e audiovisuais.
Conforme os autores do projecto referem, “Atrás da Campina é uma viagem ao fantástico universo dos Caretos da Lagoa – na região de Mira – seres místicos e assombrosos que se destinguem pelos seus trajes e rituais reminiscentes da figura feminina e do demónio.
Há séculos que aqueles homens de saias , barulhentos, cabeça cornuda, anda a perseguir raparigas da região. Mas agora os tempos mudaram. Um conflito de interpretação de gerações diferentes sobre o valor performativo de um ritual, é assim o mote para debater o caracter orgânico e fluido das tradições e quais os contributos geracionais que influenciam a alteração destas práticas rituais.”
Na linha de argumentação dos autores do documentário, o mesmo pretende criar um paradigma de evolução da tradição / ritual no tempo, apreciando e avaliando a evolução do tempo e a sua repercussão na tradição। Parafraseando o autor do projecto, “ Antigamente usava-se a máquina de escrever, hoje usam-se os computadores”।
No decorrer do documentário podemos rever exactamente esta apreciação, antigamente as “Campinas”, eram feitas com canas, vimes, chapéus velhos, fio de vela, etc...., hoje em dia, são feitas com verginhas de ferro soldadas, capacetes, entre outros materiais mais actuais। Acerca desta linha de pensamento, apraz-nos apenas referir e relembrar “Luís de Camões” :
“Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades।”
Com “Campinas” de cana, ou de ferro, esperemos que os autores deste projecto consigam alcançar a meta e o objectivo por eles traçado, e igualmente divulgar e dar a conhecer esta secular tradição, e que os mais jovens possam ver neste documentário de que é possível manter as tradições vivas, ainda que “os tempos mudem”।
(1) – mascara dos caretos da lagoa

“Dá-lhe Careto!”…


Os Caretos da Lagoa saíram mais uma vez à rua, cumprindo assim a mística tradição que desperta sempre a curiosidade de milhares de espectadores assíduos deste belíssimo e divertido ritual.Todos os anos, pelo Domingo Magro, Domingo Gordo e dia de Carnaval, os Caretos percorrem as terras de cultivo e invadem casas em busca de moças solteiras. As suas manifestações procuram causar temor, quer pelo colorido fantasmagórico das suas campinas, quer pelos sons que ecoam repetidamente. O barulho dos seus guizos e chocalhos permite aos populares antecipar o medo, adivinhando a sua vinda mesmo antes de a vista os poder alcançar.Todo o universo dos Caretos da Lagoa é muito ambíguo e desconhecido, havendo muito pouca informação histórica acerca das suas raízes, não sendo possível mais do que, baseados nos poucos documentos históricos e nos dizeres populares passados de geração em geração, levantar hipóteses e colocar questões.As vestes dos Caretos da Lagoa, nos dias de hoje, são compostas por: máscara (designada por campina) com cornos, um cone sobre a cabeça e fitas coloridas presas num arco colocado em redor do cone; camisa branca, duas correias cruzadas ao peito com guizos, campainhas ou chocalhos, saia vermelha com duas ou três barras pretas, avental branco e um cajado ou vime com dois metros de comprimento. Apesar deste ser um tema rico, complexo e visualmente atractivo, não existe muita informação ou documentação sobre esta prática. Mas que é bonito de se ver, ai isso é!“Dá-lhe Careto!”…

“Atrás da Campina”

Está a ser realizado actualmente um documentário sobre os Caretos da Lagoa, que terá como objectivo final o circuito nacional e internacional de festivais de cinema e vídeo, assim como a produção de um DVD, projecto este que se encontra em fase de pós-produção, e conta já com apoios da Câmara Municipal de Mira, Junta de Freguesia de Mira e Quitérios।O documentário pretende ser uma interrogação sobre a realidade actual do universo dos “Caretos”: retratar a encenação contemporânea e a vivência anual de uma prática e o modo como é entendida pelos seus intervenientes mais “activos” e “passivos”. Ou seja, revelar o carácter cultural, antropológico dos Caretos, e o lado social, vivencial, da prática e da reactualização que as novas gerações fazem desse ritual ancestral.Interessa pois dar voz a todos os intervenientes deste fenómeno, sejam eles Caretos activos ou meros espectadores. Deste modo, foi crucial não só registar memórias, testemunhos e experiências vividas por todos os que conviveram de perto com esta tradição, como também aceder à opinião de alguns investigadores que se vêm debruçando sobre este assunto, de forma a conseguir no final uma imagem real de uma prática e de gentes concretas que todos os anos se esforçam por manter vivos esses seres medonhos que inspiram o terror na vizinhança da lagoa de Mira.Partindo da definição popular dada pelos caretos à sua própria máscara – a campina – e da definição exacta da palavra “atrás”, pretendeu-se criar um titulo aberto a várias interpretações. Interessa retratar não só quem procura, quem persegue, quem anda atrás da história desta máscara, como também quem se esconde, quem se fecha atrás dela. Daí o nome “atrás da campina”.A Equipa responsável pela iniciativa é composta por Alexandre Mestre (realização e montagem), natural de Mira. Tem Formação Académica em Artes Plásticas, para além de diversos cursos e workshops em diferentes vertentes artísticas. Concluiu em 2005 a Pós-graduação / Especialização em Realização de Documentário. Desenvolve criação artística desde 1992 em diversas áreas, tendo ultimamente dado primazia às artes audiovisuais e teatrais. Trabalhou como criador ou cooperador em inúmeros projectos, e foi formador ou docente em diferentes vertentes artísticas. Participou como autor ou colaborador em inúmeros eventos desde 1992, tendo recebido diversos prémios e sido seleccionado para exposições e festivais, bem como participado em diversos espectáculos, em Portugal e no estrangeiro.A Produção executiva e assistência de realização é da responsabilidade de Filipe Cravo. Nasceu em Lavos, Figueira da Foz. Tem formação académica especializada em Artes Plásticas e frequentou vários workshops e cursos de áreas complementares. Tem participado assiduamente em exposições desde 1995. Em 2002 terminou o curso de Produção Criativa para TV, tendo posteriormente concretizado alguns projectos nesta área.Por fim, a Direcção e edição de som está a cargo de João José Gomes, natural de Coimbra. Realizou diversos cursos e workshops no domínio do áudio, nomeadamente Curso de Operador Geral pelo Centro de Formação da R.T.P. (2001) e o Curso de Áudio pela Escola Técnica de Imagem e Comunicação (2000/2001). Está ligado à área do áudio desde 1993 tendo sido músico e sonoplasta em diversos projectos, assim como operador e técnico de som. Participou em diversos espectáculos musicais e teatrais, produções videográficas e programas televisivos da RTP.
Jornal “O principal” - 2007-05-28

Moinhos de água cativaram visitantes

Sábado, Dia Nacional dos Moinhos। A data serviu de pretexto para abrir as portas de 132 moinhos de 13 distritos। Mira não foi excepção.Fernando Laranjeiro e João Balseiro encaixam perfeitamente na paisagem. Conhecem bem a cor da manhã, o chilrear das aves, ou a dança do pôr-do-sol. Ali bem perto da praia de Mira, são eles que dão vida a dois moinhos de água. Na Lagoa, ainda se mói cereal, grão a grão, pacientemente, como se o tempo não passasse por ali. Mas passa. E o progresso - sinal do tempo - levou alguns costumes e clientes. Os dois moleiros, ainda recordam o tempo em que, não raras vezes, o trabalho os obrigou a pernoitar nos moinhos. Na década de 60, o “tempo era de fome”. As mulheres rasgavam, ainda de madrugada, o caminho estreito ladeado de sabugueiros e de amieiras. Seguiam, depois, equilibrando a farinha à cabeça, para irem fazer a broa. “Hoje não é assim,” reconhecem. E não é, de facto. Muitos moinhos portugueses, que sobreviveram até aos nossos dias, abandonaram a sua função primitiva - moer cereais - e foram transformados em espaços de turismo rural e cultural. No passado sábado, foi o Dia Nacional dos Moinhos. A data serviu de pretexto para abrir as portas de 132 moinhos de 13 distritos, para serem visitados pelos mais curiosos. Mira não foi excepção. Os moinhos da Areia (em Casal de S. Tomé), os Moinhos da Fazendeira e o Moinho do Laranjeiro (na Lagoa de Mira) estiveram abertos para quem os quisesse descobrir pela mão - e o saber - dos respectivos moleiros. Construídos em madeira tal como os tradicionais palheiros, estes moinhos assentam por intermédio de estacarias, no leito de uma das várias valas que alimentam a lagoa de Mira. Junto ao moinho do Laranjeiros, por exemplo, ainda existem pelo menos duas rodas a moer. Os moinhos de água de rodízio só se encontram naquela região e “por isso merecem que os valorizem e que promovam a sua preservação”, refere a Rede Portuguesa de Moinhos. No sábado, cada moinho teve um programa de actividades próprio com animações, demonstrações, palestras e muitas outras acções de sensibilização. Nos Moinhos da Fazendeira o cheiro do pão acabado de cozer fez-se sentir bem cedo para acompanhar o almoço regional. Onze mil moinhos a funcionar em 1961Com esta iniciativa, a Rede Portuguesa de Moinhos quis chamar a atenção para o “inestimável valor patrimonial dos moinhos tradicionais, por forma a motivar e coordenar vontades e esforços de proprietários, organizações associativas, autarquias locais, museus, investigadores, molinólogos, entusiastas e amigos dos moinhos”. Refira-se que em 1961 existiam em Portugal 11 mil moinhos recenseados a trabalhar para “farinhação”. Hoje não se sabe quantos existem, uma vez que “muitos caíram no abandono”.O propósito da iniciativa foi também “mostrar, além do valor patrimonial, o seu valor cultural e educativo”, disse à Lusa Jorge Miranda, coordenador da Rede Portuguesa de Moinhos, promotora da iniciativa.A título de curiosidade, Jorge Miranda contou à Lusa que, no final do século XVIII, cerca de 500 moinhos de vento eram responsáveis pelo abastecimento dos mercados de Lisboa, produzindo “500 gramas de ração diária por pessoa, nem mais nem menos”. Criada em Abril de 2006, a Rede Portuguesa de Moinhos está a efectuar um inventário para conhecer e preservar este património nacional reconhecido como um dos mais diversificados da Europa.